sábado, 17 de março de 2012

Fraturas, dias frios e solstícios

Tudo pode ser facilmente comparado a um acidente grave que causou uma fratura.
Logo após o acidente, você é levada a férias na Patagônia, no inverno, sem consulta prévia. Fica lá por semanas, perdida, sem motivos para querer aquecer-se e sair. Quase morre de hipotermia. Nem é preciso descrever a dor excruciante que tudo isso causa na fratura. Depois de um certo tempo até consegue sair de lá, ir para uma cidade com clima temperado, onde as noites são um pouco frias demais, solitárias, e a fratura incomoda um pouco. Com o decorrer do tempo se acostuma, junta dinheiro, muda-se para outra mais quente e sem períodos de frio. Ela não lhe incomoda mais.
Você encontra atividades que sempre te deixem aquecida, fazendo assim com que esqueça que a fratura existe. Só que, quando menos espera vem um solstício de inverno, e a noite mais longa do ano é também a mais fria e dolorosa. Você não encontra paz, apenas dor. A fratura, que parecia curada, incomoda e muito. Não apenas ela, mas a marca que o tempo deixou em sua pele. A marca é o que mais incomoda, não a fratura em si. Ela já está curada, não é mesmo? Mas todos sabemos que quando você quebra um osso, mesmo logo após muito tempo, em dias frios ela sempre vai te incomodar, aquele osso sempre vai doer. Vez em quando você será levada a uma cidade fria, por algumas horas talvez, não mais dias inteiros. Solstícios ocorrerão duas vezes ao ano, o que mais te incomodará acontecerá apenas uma vez. Depois você aprende a burlar a noite mais longa e fria do ano, aprende a se agasalhar e ficar bem. Analgésicos e cobertores serão seus melhores amigos. A marca talvez não te incomode mais.
Porque o pior de tudo não é o acidente, mas sim a marca que ele deixou em você.


Os motivos de lamento já não são mais os mesmos. O conformismo já instalou-se de tal modo em minha vida que o único motivo de lamento passou a ser a marca profunda que ficou em mim, agora.